BLOG DO PALÓ - AVIAÇÃO

12 Abril 2012

 

Por: Catarina Abreu

 

 

Entra no cockpit. Ajusta a cadeira aos pedais e faz todos os procedimentos para garantir um voo seguro: verifica a direcção dos ventos, calcula o peso do avião, decide a quantidade de combustível a ser colocada. Enquanto isso, os passageiros do Boieng 757 esperam na sala de embarque do Aeroporto Francisco Mendes, na Praia, o seu voo para Lisboa.

 

Tudo a postos para o 'take off'. Estabilizado o avião em velocidade cruzeiro, a viagem corre de feição e, três horas e meia depois, aterra no aeroporto de Lisboa. Missão cumprida. O Comandante Hernâni Almeida levanta-se do seu cockpit doméstico e vai até à cozinha comer uma sanduíche depois de mais uma viagem nas asas virtuais.

 


Conhecido como músico e produtor, pouca gente sabe que Hernâni Almeida é também comandante com mais de 1400 horas de voo, um estudioso da aviação civil e um aficionado dos 'flight simutator" . Tal como ele existem mais de 40 pessoas em Cabo Verde, que, na penumbra, são pilotos de topo e trabalham para uma transportadora aérea virtual. Tão próxima da realidade, que às vezes os dois planos - real e virtual - se confundem. Outro desses
dedicados "profissionais" é Zunga Pinheiro. produtor de música e comandante instrutor com 8400 horas de voo.

 

É na casa de Zunga que encontramos Hernâni - que está na Praia por razões profissionais da sua vida real - e Danny, da banda TC, que divide o seu tempo entre a música, a gerêcia da Caixa Económica e os 'flight simutator".  São eles que, durante uma aterragem e um 'take off", nos explicam como funciona esse ainda desconhecido mundo dos simuladores de voo.


 

 

 

 

"É MESMO A SÉRIO"

 

Os 'flight simutator" , ou simuladores de voo, estão cada vez mais próximos da realidade. Através de alguns softwares de computador - que dão as condições climatéricas em tempo real, as informações de torres de controlo do mundo inteiro, e com planos de voo, que contêm os traçados das estradas aéreas e as caracteríslicas dos aeroportos -, estes simuladores recriam a realidade do que é estar dentro de um cockpit a pilotar um avião.


"Levamos isto mesmo a sério", diz Zunga Pinheiro, acrescentando que os simuladores de voo "não são só um vicio, também são bastante instrutivos".

 

Na sala onde tem o seu computador devidamente apetrechado para voar (dois monítores, um CPU alterado para suportar os gráficos dos programas de simulação e vários outros acessórios de "voo"), estão pilhas de papéis já lidos e relidos vezes sem conta. São os manuais de instruções de cada avião e as cartas de aproximação e de partida de vários aeroportos no mundo. Os três "pilotos" presentes estudam estes documentos com afinco.


"Os pilotos da TACV fornecem-nos documentos, explicam as técnicas, até vêem aqui para treinar, e foi com eles que aprendi muita coisa. Principalmente a parte da navegação e como trabalhar com o computador de bordo", conta Zunga Pinheiro.


Aliás, diz o produtor "piloto", o tratamento entre os pilotos "a sério" e os virtuais é de igual para igual: "Estamos totalmente familiarizados com a  linguagem da aviação. Os pilotos gostam de mostrar os equipamentos e de fornecer toda a informação que possam. Adoram partilhar o conhecimento connosco".

 

 

Esta relação entre pilotos reais e virtuais é tão igualitária, que antes de irem fazer a sua formação, muitos jovens pilotos vão simular voos na casa do Zunga. Lá têm todo o equipamento necessário e, tal como observa o produtor, "antigamente as empresas gastavam muito dinheiro no principio da formação de um piloto. Mas agora. para se iniciarem no mundo da aviação, qualquer aspirante tem que começar com estes simuladores".


Hernâni completa a história de Zunga contando um episódio vivido por um amigo seu, que teve formação de voo em ATR, mas que, na altura, não
teve oportunidade de aprender mais sobre o computador de bordo. Então, quando procurou Hernâni, foi este que lhe explicou como é que o

computador de bordo funcionava, através do simulador.

A aprendizagem de um apaixonado é, no início, complicada. Mas a persistência e a disciplina são características destes pilotos virtuais. Para Danny, o
que lhe custou mais foi entender as técnicas de navegação. "É tão lógico, mas no inicio, pode ser bastante confuso", afirma e vai lembrando que
quem o "formou" nesta área da aviação foi o já experiente Zunga.

 

Danny afiança que "0 prazer máximo dos simuladores de voo é fazer as coisas como deve ser, o mais próximo da realidade possivel". Como bom aprendiz que foi, e que ainda é, estudou com atenção todos os manuais e leva mesmo a sério o seu "trabalho".

A FLYER


A Flyer é uma empresa virtual onde "trabalham" a maioria da comunidade cabo-verdiana de pilotos, que já são cerca de 40. O objectivo é fazer o máximo de voos possivel e, claro está, ter uma companhia rentável.

 

Zunga diz que o principal problema financeiro da empresa é mesmo o excesso de combustível que, por vezes, alguns pilotos decidem usar,  desequilibrando as contas.

 

Paló, guitarrista que costuma acompanhar Títo Paris, é o presidente da companhia. Carlos Pires Ferreira é o responsável pela gestão financeira da empresa. No elenco de "profissionais" da Flyer estão personalidades conhecidas noutros meios da sociedade cabo-verdiana, como o ex-procurador da República Arlindo Figueiredo e Silva, que agora está em Timor.

 

Zunga diz que antigamente a Flyer era bem mais exigente: "Havia escalas, tínhamos que impreterivelmente estar à hora certa num determinado
aeroporto para fazermos os voos. Mas essa exigência veio a revelar-se incomportável, porque nós também temos a nossa vida".


"Depois do 'take off' e do avião estar em velocidade cruzeiro, vou tratar da minha vida", descreve Hernâni a sua rotina. "Só que começando um voo,
nomeadamente os de longo curso que duram 12 horas, temos que levá-lo até o fim. Não precisamos de estar aquele tempo todo em frente ao

simulador, mas temos que estar atentos, porque às vezes a "empresa" manda avisos para saber se o piloto está no cockpít e, se ao quarto aviso não respondermos, somos sancionados. Podemos ficar sem jogar durante semana, explica". Tirando isso, os únicos horários que têm que cumprir é

quando a "empresa" lhes marca exames."Aí temos que estar a tempo e horas para fazer o voo e sempre presentes no simulador", avisa.


Cabo Verde está bem representado neste mundo virtual. Houve um piloto que "desenhou" os aeroportos nacionais e, que segundo especialistas, são bastante reais e visitados por pilotos virtuais de todo o mundo.

 

Mais: "um controlador aéreo nosso amigo, que no inicio foi bastante resistente, reconheceu a realidade do simulador, e agora é o nosso controlador aéreo também. Por vezes ele está na torre de controlo a dar as indicações para o mundo real e tem um portátil ao lado, para dar as mesmas informações para o mundo virtual".


MÚSICA E AVIOES


Curiosa a relação entre a música e os aviões. Os nossos três testemunhos são músicos na vida real e pilotos na vida virtual. E dizem que a maior
parte dos pilotos "a sério" que conhecem são fascinados pela música, em igual proporção ao encanto que estes músicos têm pela aviação.

 

Zunga acha que ambos - músicos e pilotos - "são incompreendidos porque as pessoas não sabem do trabalho que está por tráls da vida de um músico e
de um pitoto", "Não sei porquê, mas os dois mundos, aparentemente sem terem nada a ver um com o outro, identificam-se", atira.


Hernâni confessa que quando está na música, pensa "na fluidez e na velocidade de um avião, ligando os dois conceitos". E, conta, "as alturas em que estudo mais guitarra é quando estou a fazer voos de longo curso".


Danny ri e diz que faz exactamente a mesma coisa.

 

 

"Quando estou no estúdio a trabalhar - a mistura de um disco é um trabalho muito minucioso e. por vezes, stressante - é bom fazer um voo Praia/Sal para relaxar!", afirma Hernani, Quando saía em digressão. O músico ia sempre com o seu joystick na mochíla para poder jogar. Até que houve um dia que se chateou com aquilo e comprou um portátil apropriado para simulador de voo. E agora sempre que está em digressão, assim que termina o 'sound ctieck , vai para o hotel fazer uns voos. "É mais saudável do que andar na paródia, aprende-se muito".

 

 



 

PILOTOS EM TERRA, SONHOS NO AR


A frustração ensombra levemente os discursos. Zunga lembra que, em 1977, queria ter feito um curso de pilotagem juntamente com aqueles que hoje são comandantes da TACV. Mas. na altura, foi para os Estados Unidos. onde acabou por estudar electrónica. Hoje diz sentir muita pena de não ter sido piloto.


Já Hernáni brinca: "O meu pai deu-me um teclado e rebentou com a minha carreira de piloto". Sorri e é com um olhar ansioso e os dedos a coçar para
mais um voo que fala da "adrenalina da aterragem, de todos os barulhos do cockpil e das luzes da cidade. A beleza de levantar um avião de um pais e,
horas depois, aterrar noutro lugar com o sentido de missão cumprida".


E as famílias não reclamam de tanto vicio (para elas) ou de tanta paixão (para eles)?  "Sim, reclamam muito. Não gostam do vicio". Cada vez que se sentam ao simulador para um "voozinno de relaxe", as esposas/namoradas olham-nos de lado.

 

Deve ser um vício caro também ... Têm que ter um computador adaptado para suportar os gráficos do 'flight simutator", ao qual se soma os mais de 100 contos em acessórios importados. Mas valem todos os sacriflcios para estes pilotos em terra, com os sonhos no ar.

 

 

 NOTA: Este texto foi publicado há já vários anos, pelo que alguma informação está desactualizada. Como noutras áreas, a simulação e tudo o que lhe é inerente, vai actualizando a uma velocidade constante e bem rápida. Paló.

 

 

publicado por Paló às 19:38

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